sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Programa de Atendimento Fonoaudiológico para Cantores - Promoção da Saúde

Este programa busca contribuir para a prática fonoaudiológica junto aos cantores amadores e profissionais no tocante a promoção da saúde vocal. Trata-se de uma sugestão didática sobre o desenvolvimento do atendimento de cantores com objetivo de promover a saúde vocal e conseqüente aumento da resistência vocal. O programa foi dividido em etapas e o tempo disponível para cada uma delas está vinculado à dinâmica de trabalho empregada pelo fonoaudiólogo e pelo grau de assimilação dos conteúdos pelo cantor. As etapas constam de:

1. Aplicar triagem vocal com objetivo de selecionar cantores para as ações fonoaudiológicas em grupos ou individual;
2. Realizar avaliação vocal perceptual da voz cantada e falada, análise acústica da voz falada e gravação em vídeo da voz cantada;
3. Explanar sobre a fisiologia vocal, os distúrbios da voz e saúde vocal para o cantor;
4. Conhecer e aplicar técnicas para relaxamento e aquecimento vocal. Prática de canto: enfoque no relaxamento. Conhecer e aplicar técnicas para desaquecimento vocal;
5. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Conhecer e adequar a respiração para a fonação: tipo, capacidade e controle pneumofônico. Prática de canto: enfoque na respiração. Aplicar técnicas para desaquecimento vocal;
6. Aplicar técnicas de aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Prática de canto: enfoque no relaxamento e respiração. Aplicar técnicas de desaquecimento vocal;
7. Aplicar técnicas de aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Conhecer e aplicar técnicas para articulação. Prática de canto: enfoque na articulação. Aplicar técnicas para desaquecimento vocal;
8. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Prática de canto: enfoque na articulação. Aplicar técnicas para desaquecimento vocal;
9. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Conhecer a importância da audição para o canto. Treino auditivo: voz cantada e falada disfônica e adaptada;
10. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Prática de canto: enfoque no relaxamento, respiração e articulação. Aplicar técnicas para desaquecimento vocal;
11. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Conhecer e aplicar técnicas para ressonância. Prática de canto: enfoque na ressonância. Aplicar técnicas para desaquecimento vocal;
12. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Aplicar técnicas para ressonância. Prática de canto: gravação em vídeo. Aplicar técnicas de desaquecimento vocal. Reavaliação;
13. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Aplicar técnicas para ressonância. Conhecer e aplicar os recursos do microfone. Prática de canto: uso do microfone. Aplicar técnicas para desaquecimento vocal;
14. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Aplicar técnicas para ressonância. Conhecer e aplicar os recursos não verbais – gesticulação, expressão facial. Prática de canto: uso de recursos não-verbais. Aplicar técnicas para desaquecimento vocal;
15. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Aplicar técnicas para ressonância. Aplicar os recursos não verbais – gesticulação, expressão facial. Prática de canto: uso do microfone e de recursos não-verbais. Aplicar técnicas para desaquecimento vocal;
16. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Aplicar técnicas para ressonância. Seleção de repertório;
17. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Aplicar técnicas para ressonância. Treino auditivo e visual: apresentação de vídeos de cantores;
18. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Aplicar técnicas para ressonância. Aplicar os recursos não verbais – gesticulação, expressão facial. Prática de canto: ensaiar repertório. Aplicar técnicas para desaquecimento vocal;
19. Aplicar técnicas para aquecimento vocal. Ajustar a respiração para a fonação. Aplicar técnicas para articulação. Aplicar técnicas para ressonância. Aplicar os recursos não verbais – gesticulação, expressão facial. Prática de canto: ensaiar repertório no local da apresentação. Aplicar técnicas para desaquecimento vocal;
20. Devolutiva do atendimento fonoaudiológico.

As práticas de canto funcionam como recursos para fixar as técnicas propostas pelo fonoaudiólogo. Deve-se discutir o programa fonoaudiológico com o professor de canto para que haja consonância entre as atividades propostas.
Charleston Palmeira

terça-feira, 20 de maio de 2008

O Abandono terapêutico

“Quando não estou nem disposto, nem senhor de mim,
cada um de meus doentes se torna para mim um espírito maléfico”
(Carta 130 de Freud à Fliess)

Anos de estudos acadêmicos em anatomofisiologia, patogenia, avaliação e reabilitação dos distúrbios vocais, por vezes nos afastam da compreensão de determinados movimentos da clínica fonoaudiológica. O abandono terapêutico é um destes. É a nossa experiência clínica que nos permite questionar quais os motivos que levam o paciente a abandonar seu tratamento. A formação positivista nos priva de adentrarmos mais intimamente nas imagens do paciente frente a sua voz, no conhecimento das possibilidades deste em modificar suas características comunicativas, calcadas na cultura, e na forma de estimular a motivação para estabelecer mudanças necessárias na sua conduta vocal desviada. Em muitos pacientes prevalece uma extraordinária resistência à reabilitação vocal devido ao desejo ou necessidade de perpetuar uma voz que lhe traga ganhos secundários (econômicos, sociais, pessoais etc.) e a dificuldade de eliminar hábitos prazerozos(listados nos quadros de abuso e mau uso vocal). Como, então, compreender melhor estes fenômenos quando possuímos uma leitura eminentemente organicista-positivista das manifestações disfônicas?
Entendemos que seja função do fonoaudiólogo investigar, não só o histórico da disfonia, as características comunicativas e as alterações funcionais e estruturais do aparato fonador, mas também os aspectos que fazem o paciente resistir à reabilitação findando no abandono de seu tratamento. É compreender que este universo comunicativo, onde a voz é apenas uma parte integrante da grande linguagem, está ligado ao imaginário, ao desejo, à repressão, à corporalidade(KÖRNER, 1981) , reflexo das relações com a cultura
Compreender as técnicas terapêuticas como suporte ou mesmo trampolim para atingirmos uma voz viável social e profissionalmente, exclui a possibilidade de utiliza-las unicamente com fins motores. Entendemos que os distúrbios da voz perpassam por uma disfunção cinética, devendo ser tratada como tal, porém uma visão reducionista da ação terapêutica pormenoriza questões subjetivas, emocionais e psicossociais em detrimento das questões eminentemente fisiológicas. Esta postura leva-nos a crer que o fonoaudiólogo, inúmeras vezes, protege-se por detrás do discurso organicista, quando deveria manter-se além do discurso corrente do paciente-sujeito.
É sempre necessário refletir nosso papel frente a reestruturação das representações ligadas à voz e a disfonia e ao movimento da subjetividade do paciente disfônico em terapia. É compreender a comunicação como um processo mais complexo e instigante . Acreditamos ser esse o ponto-chave para o início do entendimento da relação homem-mundo-sintoma na clínica fonoaudiológica, trazendo o paciente-sujeito mais próximo, fazendo com que o paciente sinta-se apoiado e compreendido na sua real problemática , na tentativa de compreendermos, cada vez mais, as nossas “brechas terapêuticas”.
Charleston Palmeira

domingo, 4 de maio de 2008

Gesticulação e telejornalismo

O fonoaudiólogo quando atua junto ao telejornalismo tem como base um plano de trabalho que visa desenvolver a saúde vocal, a expressividade, a naturalidade do profissional, o ritmo de fala, a entonação e a suavidade do sotaque. A televisão, que tem a visão e a audição como principais canais de recepção, exige uma comunicação diferenciada do rádio, pois são solicitados, além dos recursos verbais e vocais, os recursos não verbais. Segundo Kyrillos, Andrade e Cotes (2002) são estes os recursos que colaboram para uma ideal expressividade dos profissionais do telejornalismo.
Os recursos verbais estão associados ao que é dito, ao conteúdo semântico e seu efeito sintático. É sempre oportuno lembrar que o fonoaudiólogo não desenvolve o texto, mas colabora na sua sonoridade, orientando sobre os efeitos negativos das frases longas, rimas e para o excesso de fonemas com a mesma sonoridade.
Os recursos vocais relacionam-se com os aspectos supra-segmentais, como pitch adequado para o texto, loudness variável, uso de pausas respiratórias e interpretativas, articulação precisa e sotaque, que não deverão se sobrepor à notícia. A inflexão, um dos aspectos mais importantes dentro do telejornalismo, deve variar de acordo com a intenção do discurso, através de alterações no pitch, na loudness e na velocidade da fala. Os gestos, as expressões faciais e a postura compõem o grupo dos recursos não-verbais. Gestos, recurso não-verbal mais utilizado, são ações corporais que transmitem uma idéia ou sentimento. Surgem de forma espontânea, para complementar ou conduzir a mensagem, sem que o outro perceba conscientemente (POLITO, 1996). Podem vir antes ou durante a fala. KNAPP e HALL (1999) destacam as seguintes funções para os gestos: substituir a fala, regular o fluxo e o ritmo da interação, manter a atenção, dar ênfase ao discurso e ajudar a caracterizar e memorizar o conteúdo do que é dito. Cotes (2002) relata que no telejornalismo a linguagem é única, onde a imagem e voz fundem-se e interatuam e a performance e a credibilidade são preocupações constantes. Os apresentadores devem passar uma imagem dinâmica, inspirando confiança, equilíbrio, segurança e honestidade. Menciona também que o telejornalismo é uma situação artificial e requer estudo prévio e que mais importante que as modificações dos gestos é a flexibilidade dos movimentos.
Ekman e Friesen (1981) classificam os gestos como:
Emblemas: tradução verbal direta (Ex: fazer figa, elevar o polegar). São evitados no telejornalismo;
Ilustradores: enfatizam a palavra ou frase (Ex: o garoto era desse tamanho);
Reguladores: são involuntários (Ex: movimentos de cabeça, direcionamento dos olhos);
Manifestações afetivas: configurações faciais que manifestam estados afetivos, conscientes ou inconscientes;
Adaptadores: manipulação de uma parte do corpo ou objeto, “muleta” (Ex: manipular o cabelo, mexer na caneta).
O trabalho junto à bancada no estúdio de telejornal requer atenção para a posição e o movimento das mãos, a expressão facial e a postura.
Cotes (2002) reforça que os filósofos da antiguidade designavam as mãos como segunda inteligência, tamanha sua expressividade e que revelam de modo involuntário as emoções. Seus movimentos no vídeo não devem ultrapassar a linha do queixo. Uma posição de descanso ou neutra deve ser adotada, evitando mãos separadas e espalmadas sobre a bancada. Gesticular com as duas mãos poderá parecer exagero no vídeo. Sobre a expressão facial deve-se evitar: fugir com os olhos, olhar para um ponto fixo, olhar desconfiado e olhar perdido (POLITO, 1996); expressar mistério, impenetrabilidade ou charme. As sobrancelhas acompanham os movimentos da cabeça e os aspectos supra-segmentares da fala em seus movimentos de elevação e abaixamento. Atentar-se para piscar os olhos, evitando o olhar perdido ou mesmo o excesso de piscadelas. A postura tem um caráter estético e funcional. Para o telejornalismo o ideal é uma postura ereta, olhando para a câmera, costas firmemente apoiadas, pés no assoalho e um pouco distantes. Assim, transmite-se segurança (COTES, 2002).

Alguns exercícios poderão ser realizados, como sugerir um modo de gesticular de acordo com as seguintes frases:
- O importante na obra de arte é o espanto (Charles Baudelaire). Gesto: um dos indicadores poderá estar para cima finalizando com sobrancelhas levemente elevadas.
- Ópera é quando o sujeito recebe uma facada nas costas e, em vez de sangrar, canta (Ed Gardner). Gesto: início com mãos em posição neutra, depois seguem unidas para direita e ao final para a esquerda.
- Eu não procuro. Eu encontro (Pablo Picasso). Gesto: as mãos poderão apontar para fora e ao final para dentro.
- É revoltante ver uma pessoa que se sacode e diz que é ator ou atriz. (Raul Cortez). Gesto: evitar o gesto ilustrado de rebolar. As mãos poderão fazer um gesto de negação e a cabeça pontuar as palavras ator e atriz.
- Este maestro rege como se estivesse batendo maionese (Hebert Von Karajan). Gesto: o dedo indicador de uma das mãos poderá realizar um círculo suave indicando o movimento da maionese

O trabalho deve obedecer a filosofia da empresa que veicula o telejornal. Porém, regas básicas são úteis para evitar excesso ou ausência de expressividade. Assim, o bom senso também é um aliado para não tornar notícias sérias em sensacionalistas e as vitórias esportivas, em derrotas.

Charleston Palmeira

Referências
COTES, C. Articulando voz e gesto no telejornalismo. In. FERREIRA, L. P.; ANDRADA E SILVA, M A. Saúde vocal: práticas fonoaudiológicas. São Paulo: Roca, 2002.

KYRILLOS, L.; ANDRADE, D.F; COTES, C. Fonoaudiologia na telejornalismo. In. FERREIRA, L. P.; ANDRADA E SILVA, M A. Saúde vocal: práticas fonoaudiológicas. São Paulo: Roca, 2002.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Proposta de seqüência respiratória

O fonoaudiólogo constrói seu plano de trabalho baseando-se na anamnese, na avaliação propriamente dita, nos exames complementares e em aspectos subjetivos, tais como suas preferências e familiaridade com as técnicas. Ao estabelecer quais as técnicas deverão ser empregadas para um determinado quadro clínico, este as organiza em uma seqüência que Behlau et. al. (2005) definem como uma série de procedimentos ou exercícios organizados, com ordenação temporal predeterminada, para um fim específico. Assim, ao longo de sua prática, acaba por criar seqüências terapêuticas que muitas vezes merecem ser divulgadas e experienciadas por outros colegas.
Este artigo é resultado de alguns experimentos com uma seqüência que tem como base a organização da respiração para o aperfeiçoamento da comunicação oral e reabilitação fonoaudiológica para as disfonias.
Para a administração da referida seqüência é necessário que o paciente tenha realizado exercícios de relaxamento e alongamento da região cervical e face. Levando-se em conta a premissa de que a maioria dos pacientes s apresenta tensão fonatória, procedimentos de relaxamento propiciam melhores condições para o controle muscular, podendo, assim, desfazer padrões funcionais errados (de voz, postura etc.) e adquirir os corretos. Favorecem, também, a atenção e concentração para a execução das atividades propostas. Casos específicos como paralisias, paresias de laringe e distúrbios hipocinéticos devem ser analisados quanto à contribuição inicial de relaxamento laríngeo.
A seqüência respiratória é centrada na respiração inferior. Cabe ao fonoaudiólogo, juntamente com seu paciente, determinar o tipo mais apropriado: abdominal ou intercostal diafragmático. Ou seja, se a expansão abdominal é anterior, lateral ou em ambos. Aqui, a respiração abdominal anterior será a tônica, sendo instalada apenas solicitando ao paciente de dilate o abdome e ao contrai-lo produzir simultaneamente um sopro fraco e suave. O paciente não deverá entrar no ar de reserva. No instante que o abdome se dilata, a inspiração é realizada sem a participação excessiva da musculatura superior, fato este que contribui para a redução das tensões cervicais e laríngeas. Sugere-se, inicialmente, não utilizar os termos inspiração e expiração, pois de início, estão contaminados de tensão decorrentes da má utilização da respiração para fala. Após produção do sopro fraco, serão realizadas as seguintes seqüências de emissões:
- Sopro dividido em duas, três, quatro ou mais partes. Cuidado para não ocorrer uma inspiração entre eles. A quantidade de sopros está diretamente associada ao conforto e à capacidade respiratória do paciente.
- Emissão de fricativos surdos. O “s” geralmente é o de melhor rendimento, visto que o “f” poderá ser de difícil execução e o “x” exige maior gasto de ar. É importante que todos os fricativos sejam aplicados, de preferência alternados. Exemplos: inicia-se uma emisão com “s”, altera-se para o “f” e finaliza em “x” ou mesmo a realização de várias emissões em “s”, finalizando em “x”. A criatividade do fonoaudiólogo colaborará para a motivação do paciente frente aos exercícios.
- Emissão dos fricativos sonoros. A fonte glótica é acionada durante a execução dos exercícios sonoros com o “z”,”v” e “j”. O princípio é o mesmo dos fricativos surdos, alternando-os com os fricativos surdos. Exemplo: inicia-se com “s”, intercalando com o “z” em uma mesma expiração.
- Emissão das vogais. A atividade eminentemente glótica exercida pelas vogais, requer atenção do fonoaudiólogo para que não ocorram tensões, ruídos e incoordenações respiratórias. As vogais formam a realeza dos sons, por isso, todo cuidado é pouco. As vogais poderão ser emitidas após fricativos surdos e sonoros
- Emissão de números, palavras e frases. Neste momento, a atividade de fala é solicitada, aproximando o controle respiratório daquele utilizado durante a fala espontânea. O número de palavras deve ser aumentado gradativamente, atentando-se para os ajustes pneumofônicos.
- Leitura. Para o sucesso do exercício é necessária uma seleção criteriosa dos textos. Fontes grandes, frases simples e vocabulário coloquial favorecem a leitura, principalmente daqueles que têm dificuldades neste ato. Os textos de frases curtas devem anteceder os de frases médias e longas. Neste caso, a poesia é um recurso útil. Marcar com barras os pontos onde a inspiração deve ocorrer colabora para a fluência respiratória.
- Fala espontânea e fala profissional. A ultima etapa da seqüência respiratória envolve o uso da fala social e profissional. Comumente o paciente encontra dificuldades em coordenar a respiração com seus conteúdos de fala. Assim, a orientação para realizar frases curtas contribui para a efetividade do exercício.
Após todas estas etapas, acredita-se que uma respiração adaptada aos ajustes fonatórios esteja encaminhada. Cabe ao fonoaudiólogo, dentro de seus interesses, empregar a seqüência respiratória proposta com sensatez. Aliás, esta é a palavra chave quando o assunto é voz.
Charleston Palmeira

quarta-feira, 16 de abril de 2008

16 de abril - Dia Mundial da Voz

Quando abril se aproxima, nós, os fonoaudiólogos, já ficamos à espera de informações sobre as comemorações e ações a serem realizadas no Dia Mundial da Voz, 16 de abril. A semana que contempla este dia é recheada de eventos que se voltam para a promoção da saúde vocal, prevenção e detecção dos distúrbios da voz, em especial, aqueles que são reflexos do câncer de laringe. Sabemos que o dever nos aguarda, pois é hora de prestarmos nosso serviço à população carente de informação.
Com objetivo de conclamar a população para ações educativas voltadas para a conscientização vocal e suas implicações na comunicação, na saúde e na cultura, a campanha desenvolvida em torno do Dia da Voz promove uma grande visibilidade pelas autoridades e imprensa, mas principalmente uma significativa procura por parte da população.
Desde 1998, ano do início da campanha, a comunidade fonoaudiológica vem se mobilizando para promover ações que favoreçam a conscientização da sociedade quanto à importância da saúde vocal e a prevenção de alterações na voz. Em anos ímpares, a campanha visa atender a população, principalmente em praças públicas e em postos de atendimento. Nos anos pares a campanha é eminentemente educativa e institucional.
Estimular a presença de fonoaudiólogos e estudantes do curso de Fonoaudiologia nesta prática, colabora para o desenvolvimento de uma mente plural quando o assunto é a saúde coletiva. As experiências adquiridas em uma campanha desta natureza auxiliam ao fonoaudiólogo (e futuro) a compreender alguns aspectos deste trabalho junto à sociedade. Ganha a profissão e a população.
O sucesso da campanha é reflexo de uma parceria entre todos aqueles que acreditam que o fim último é o bem-estar da sociedade. E esta sociedade agradece ao espírito empreendedor e apaziguador do Dr. Wilson Meireles, coordenador geral da campanha, da Dra. Maria Carlos, que geriu a campanha de maneira exemplar; a todos os médicos e fonoaudiólogos que são os grandes amigos da voz; ao apoio do Conselho Regional de Fonoaudiologia 8ª. Região; à visão de saúde coletiva incorporada pelo Curso de Fonoaudiologia da UNIFOR, representado pela profa. Christina Praça e seus queridos docentes ao seu Centro Acadêmico e a todos os estudantes que abraçaram este exercício de cidadania e a Cooperativa de Fonoaudiologia do Estado do Ceará, que tem uma visão para além da empresarial: tem um compromisso com o social. Importante também salientar a participação do Conservatório de Música Alberto Nepomuceno que sempre abraça a causa de uma maneira singular através do canto.
Que nós possamos sempre trabalhar juntos em prol da saúde coletiva, que sejamos cada vez mais ousados em nossas atividades de promoção da saúde e que unamos ainda mais as nossas forças para a inserção da Fonoaudiologia no serviço público, já!
Charleston Palmeira

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Falsete mutacional - um estudo de caso

O falsete mutacional reflete o fracasso em adquirir uma voz de sonoridade adulta, não apresentando alterações de natureza estrutural laríngea. A apresentação de um caso clínico visa esclarecer sobre sua sintomatologia, diagnóstico diferencial, tratamento pertinente. Relataremos o caso de M., sexo masculino, 22 anos, balconista. Queixou-se de "voz muito fina e fraca", dificultando no seu convívio social. Referiu que no início da puberdade, começou a emitir "uma voz diferente", não a mantendo por considerá-la "uma voz grossa e feia". Os dados relevantes da avaliação perceptual foram: tensão fonatória associada à elevação da laringe, incoordenação pneumofônica caracterizada por utilização do ar de reserva, pitch muito agudo, loudness mediana, sonoridade intermitente com quebras para o registro basal, gama tonal e tempos máximos de fonação reduzidos. As provas terapêuticas, que envolveram uso da tosse, manipulação digital e bocejo, foram aplicadas com objetivo de realizar diagnóstico diferencial de alterações vocais de natureza hormonal, sensorial e estrutural congênita ou adquirida antes do período da muda vocal. O exame laringoscópico confirmou o diagnóstico de disfonia funcional, caracterizada por falsete mutacional. A reabilitação vocal teve como objetivo estabelecer a voz fisiológica, suscitando no paciente a percepção das mudanças ocorridas em sua voz, fazendo ater-se ao seu novo modo de se subjetivar através desta. Foram empregadas inicialmente as técnicas de tosse (que logo foi substituída por [R]) associada às vogais, sílabas e palavras; som basal; manipulação digital e vocalização inspiratória. Seguiram-se as técnicas de sons fricativos sonoros, vibrantes, nasais; exercícios de melodia e leitura para estabilização vocal. Utilizamos exercícios de relaxamento da região cervical, respiração, técnica de mastigação, bocejo e fala salmodiada, para promover suavização da emissão.Apesar da inicial rejeição da voz mais grave, o paciente assimilou positivamente sua nova forma de emissão, sempre referindo mudanças significativas em sua maneira de lidar com as pessoas e com a vida.

Charleston Palmeira

domingo, 23 de março de 2008

Aperfeiçoamento da comunicação oral

O campo fonoaudiológico comporta inúmeros procedimentos de ordem preventiva e reabilitadora. A necessidade de investigar a melhor eficácia destes procedimentos estimula a realização de pesquisas que objetivam dimensionar o alcance da Fonoaudiologia. Estudos nas áreas da Audição, Motricidade Orofacial, Linguagem e Voz auxiliam ao fonoaudiólogo entender melhor o seu ofício e, assim, contribuir para um melhor bem-estar da sociedade.
O uso profissional da voz é um dos temas mais discutidos em periódicos e congressos científicos devido sua importância no cenário profissional do mundo moderno, visto que a utilização equivocada da comunicação oral poderá acarretar diversos transtornos para a saúde do falante, estabelecendo, por sua vez, dificuldades na decodificação das mensagens enviadas ao ouvinte.
O grupo de atividades que favorecem a comunicação oral nos diversos profissional da voz tais como professores, vendedores, locutores, operadores de telemarketing e cantores, recebe várias denominações: aperfeiçoamento vocal, aprimoramento vocal, impostação da voz, estética ou mesmo ginástica vocal (Nascimento e Ferreira, 2000). Talvez o uso do termo aperfeiçoamento da comunicação oral seja o mais pertinente para as atividades propostas ao profissional da voz, pois não somente a voz será potencializada, mas também aspectos como vocabulário, expressividade, articulação, fluência, velocidade da fala e oratória. Ou seja, comporta um grupo de técnicas que contribuem para uma expressão oral objetiva, clara, relaxada e natural e, assim, favorecer o desempenho profissional. Modelos de atuação fonoaudiológica, com objetivo de promover o aperfeiçoamento ou reabilitação da comunicação oral foram descritos com sucesso por inúmeros estudiosos do campo fonoaudiológico (Carrasco, 2001; Garcia, 2002; Lopes, 2002).
A necessidade de se ter um bom desempenho de fala e voz advém da Grécia Antiga e os primeiros manuais de exercícios da voz datam do século XVI. Apesar de tantos séculos de comprovação da eficiência dos exercícios para o aperfeiçoamento da comunicação oral, o mundo moderno ainda tenta utilizar paliativos que tentam substituir condutas realmente eficazes para os problemas da voz.
As práticas fonoaudiológicas revelam que, apesar da considerável prevalência de alterações vocais em profissionais da voz, devido à ignorância total do comportamento vocal normal, agravado pelo esforço vocal diário, ainda é pequeno o interesse real a cerca do uso adequado da voz e das conseqüências do mau uso desta. É sabido, porém, que a proporção que aumenta o tempo de profissão aumenta também o número de profissionais que procuram o fonoaudiólogo para tratarem problemas decorrentes do uso profissional da voz. Procurar esta modalidade de serviço fonoaudiológico quando já apresentam alterações vocais permanentes faz dos cursos de aperfeiçoamento da comunicação oral verdadeiros ambulatórios. Na verdade, esses profissionais necessitam de procedimentos para a reabilitação vocal inicial para eliminação do distúrbio e, só após, serem encaminhados para aperfeiçoar suas características comunicativas.
Acompanhando os resultados dos procedimentos que os fonoaudiólogos dispõem para qualificar a comunicação oral as empresas e instituições de ensino têm compreendido a importância da Fonoaudiologia e ofertam, em seus programas de capacitação profissional, cursos ministrados por fonoaudiólogos que orientam seus profissionais a desempenharem suas funções vocais com menor esforço, maior eficiência e maior naturalidade de emissão. A sociedade, refém da multi-poluição e do estresse social, tem vislumbrado na Fonoaudiologia uma modalidade terapêutica para melhorar a qualidade de vida. Assim, o verdadeiro sentido do aperfeiçoamento, prevenir distúrbios e desenvolver as qualidades comunicativas, ganha clareza e percorre o caminho para seu reconhecimento, em um país que pouco compreende, discute e aplica o verbo prevenir.
CARRASCO, M.C.O. Fonoaudiologia empresarial – perspectivas de consultoria, assessoria e treinamento. São Paulo: Lovise, 2001.
GARCIA, A.A. Vivências corporais vocais: prática preventiva. In: Saúde vocal – práticas fonoaudiológicas. São Paulo: Roca, 2002.
LOPES, V. Oratória e cursos de comunicação oral. In: FERREIRA, L. P.; ANDRADA E SILVA, M A. Saúde vocal: práticas fonoaudiológicas. São Paulo: Roca, 2002
NASCIMENTO, M. A.; FERREIRA, L.P. A Voz num contexto não terapêutico: visão do fonoaudiólogo. In: FERREIRA, L.P.; COSTA, H.O. Voz ativa – falando sobre o profissional da voz. São Paulo: Roca, 2000.

* Adaptação, realizada pelo próprio autor, do texto Comunicação oral na escola. In: DAMASCENO, A., MACHADO, H.; SOUZA, O. Fonoaudiologia escolar – Fonoaudiologia e Pedagogia, saberes necessários para a ação docente. Belém: EDUFPA, 2006.

Charleston Palmeira

segunda-feira, 10 de março de 2008

Proposta de triagem vocal para corais

O trabalho fonoaudiológico junto aos cantores requer conhecimentos específicos da área do canto e da música. Não se trata de fazer do fonoaudiólogo um expert em canto, porém, ao agregar este saber o fonoaudiólogo transita no mundo do canto e da música com maior conforto.
Este artigo pretende expor um protótipo de triagem vocal para cantores coralistas, tendo a premissa de que se trata de um trabalho realizado com a voz cantada, independente do gênero e estilo musical, em grupo que apresenta diversas sonoridades, ou seja, vozes graves e agudas, masculinas e femininas.
O trabalho se inicia com a distribuição da ficha de triagem entre os coralistas. Que deverão preenchê-la de acordo com os comandos e informações do fonoaudiólogo.
A queixa deverá ser descrita pelo coralista de forma clara e coloquial, sem a preocupação em utilizar termos técnicos, fonoaudiológicos ou musicais. Importante também o registro de problemas vocais anteriores, incluindo quadros de afonia. Atentar para o tempo de permanência do problema, como foi solucionado e se houve recidiva.
Segue com a investigação dos distúrbios mais freqüentes relacionados à voz. Eis os sugeridos para constar na ficha de triagem: rouquidão, perda da extensão vocal, aperto na garganta, cansaço vocal, bolo na garganta, pigarro, tosse, ardor e dor na garganta, ressecamento, dificuldade para engolir, sensação de corpo estranho, problemas na audição, obstrução nasal, coriza, alergias, emoções, outro ou nenhum.
Para se cantar em um coral o participante deve ter sua voz classificada (ou pré-classificada) por um professor de canto experiente que indique o naipe no qual irá participar. A classificação vocal está assim determinada: soprano, referente à voz feminina aguda; mezzosoprano, voz feminina mediana; contralto, voz feminina grave; tenor, voz masculina aguda; barítono, voz masculina mediana e baixo, voz masculina grave. Deve-se ficar atento, pois algumas escolas de canto acrescentam subclassificações como, por exemplo, soprano coloratura, lírico e dramático. O coralista, assim como o professor de canto, poderá ainda ter dúvidas sobre a classificação de sua voz devido imaturidade vocal ou pela voz ainda estar em processo de classificação.
A realização de técnica vocal deve ser informada, assim como descrições sobre a modalidade de canto que executa: se erudito ou popular, com respectivo estilo, e sobre o uso do canto em carreira solo.
Para que sejam administradas orientações sobre o uso adequado da voz, a descrição do ambiente de trabalho é de fundamental importância para a identificação de agentes agressores á voz. Outro aspecto que sempre acompanha as triagens na área da voz é a informação sobre os fatores desencadeantes e agravantes de disfonia, sendo os mais referidos: o abuso da voz, mau uso da voz, alimentação inadequada, distúrbios do sono, consumo de bebidas alcoólicas e fumo, poluição sonora e ambiental, automedicação, sedentarismo e equipamentos de amplificação ineficientes.
As questões sobre as impressões dos outros e do coralista sobre sua voz colaboram para a avaliação da psicodinâmica vocal construída pelo coralista.
Realizar uma avaliação perceptual da voz em um coral inteiro requer tempo, porém alguns aspectos poderão ser analisados para orientações e encaminhamentos iniciais. Tensões cervicais e posturas inadequadas devem ser investigadas durante os ensaios e apresentações, assim como o tipo respiratório e a coordenação pneumofônica. Dois testes de fácil execução são sugeridos: o teste de contagem e a aferição dos tempos máximos de fonação. Aspetos sobre a mobilidade dos órgãos fonoarticulatórios devem ser registrados. Por fim, analisa-se o tipo de voz com a possibilidade do uso da escala GIRBAS.
Na seqüência, o fonoaudiólogo poderá sugerir um acompanhamento fonoaudiológico para o coral em questão. Por falar em questão, está é mesmo uma outra questão. Discorramos depois!
Charleston Palmeira

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Orientações sobre o uso do microfone

O microfone é um grande aliado da comunicação oral, pois é um recurso que amplifica a voz, minimiza seus desgastes e facilita a compreensão pelo ouvinte. A oferta de um microfone é uma gentileza que deverá ser sempre aceita. O medo de seu uso se deve à falta de prática e em especial, a dificuldade de perceber a auto-imagem vocal amplificada. O microfone apenas amplifica e não deve distorcer a voz. Porém, problemas de comunicação serão amplificados (ruídos, nasalidade, erros gramaticais, fricativos e plosivos acentuados, intensidade elevada). Importante salientar que não há microfone universal. São necessários microfones diferentes para a música, para a palavra, para os ambientes sonoros barulhentos, para os sons longínquos. Eles podem ser do tipo cardióide (capta o som pela frente) e omnidirecional (capta em todas as direções) e em vários modelos, como os com cabo, sem cabo, lapela, girafa e headset.
Eis algumas orientações para tirar melhor proveito desta ferramenta:

- Verificar se está ligado, pois é comum os falantes iniciarem um discurso com o microfone desligado;

- Utilizar capa de sopro para suavizar os sons plosivos e fricativos e também para evitar que gotas de saliva danifiquem o equipamento;

- Testar com a voz. Não se deve soprar ou bater no receptor;

- Verificar o retorno da voz logo no início da apresentação. De preferência com antecedência;

- Cuidado com a microfonia. Deve-se retirar o microfone da direção das caixas de som para que o ruído da microfonia finde;

- Não utilizar uma voz artificial. Sempre falar de modo natural;

- Não gritar, pois a amplificação causará desconforto aos ouvintes;

- Segurar o microfone de modo firme, abaixo da boca para que o público realize leitura labial. Não segurar próximo ao cabo e nem próximo ao receptor;

- A distância da boca será de acordo com a qualidade da captação do som. Não ultrapassar 10 cm, mas também não aproximar demais ou coloca-lo de lado;

- Não anteriorizar a cabeça, pois promove distorções na voz. Deve-se aproximar o microfone da boca e não vice-versa

- Verificar tamanho do cabo, estando sempre à frente do falante para que se possa caminhar sem que ocorram intercorrências. Não enrolar o cabo na mão, pois poderá danificá-lo;

- Não gesticular com a mão do microfone;

- Colocar, retirar e ajustar no pedestal desligado, evitando ruídos desagradáveis;

- Ajustar o pedestal para ler de forma que não atrapalhe o manuseio das páginas.

Estas são algumas orientações que poderão colaborar para uma performance natural e eficiente. Deve-se utilizar um microfone de boa qualidade, assim como conectá-lo a um sistema de som que não provoque distorções.
Em tempo: se o falante não tiver conteúdo e expressividade, não será o microfone que irá salvar a apresentação. Para isto, existem os fonoaudiólogos. Sucesso!

Charleston Palmeira

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Uma breve reflexão sobre respiração e voz

A literatura fonoaudiológica possui uma respeitável relação de textos sobre a importância da respiração para a produção da voz. Não é nosso propósito realizar uma análise destas obras, mas sim se utilizar da fisiologia respiratória para compreender melhor nossos planos de atendimento junto ao paciente acometido de disfonia hipercinética. As diferenças entre a respiração vital e a respiração motriz nos trás dados importantes para nossa clínica. Vamos nos deter em apenas uma delas: a respiração vital não encontra, em sua fisiologia normal, nenhum obstáculo durante seu movimento expiratório, enquanto que a respiração motriz tem sua expiração obstacularizada pelas pregas vocais em adução e pelos articuladores. Retiramos desta assertiva o que acreditamos ser a base para a reabilitação vocal de natureza hipercinética: a redução da hiper-obstacularização da passagem do ar, e conseqüente melhora da qualidade vocal. Entendemos que a fonação não seja um ato de natureza relaxante, pois dele se gasta energia e se emprega forças musculares. Tais forças quando se excedem, por motivos vários, findam por reter a livre excursão do ar sonorizado. E quais os locais desta retenção? As válvulas: glote e articuladores. Daí, entendemos que a reabilitação vocal nestes quadros sempre deverá estar perpassando sobre esta premissa, mesmo naquelas filosofias fonoterapêuticas que não empreendem a respiração como importante aspecto a ser reorganizado no paciente acometido de disfonia hipercinética. Assim, corroboramos com a tese de que a busca de um equilíbrio entre o ar expiratório, as forças glóticas e os movimentos articulatórios durante o ato da fonação formam uma tríade-mestra para o caminho do sucesso na terapia vocal. E não precisamos ir muito longe para sabermos disso. Convém apenas escutar o que nosso corpo nos solicita o tempo todo: libere-me das minhas válvulas emperradas!
Charleston Palmeira

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Fonoaudiologia e Radio Web

No mundo moderno a comunicação oral é uma grande moeda de troca entre os povos. Dela surge um emissor, com capacidade de expressar seu pensamento com presteza e objetividade, e que se dirige a um receptor, ávido de uma informação. O receptor informa ao emissor que o compreendeu. Daí fecha-se o ciclo comunicativo que cria, transforma e faz evoluir todos os tipos de relação.
Mas entre o emissor e o receptor existe a mensagem em forma de palavras, gestos, mímica facial, postura, silêncios... Em meio a tantos atributos da mensagem veiculada pela fala podem existir ruídos e fazerem ruir uma comunicação que deveria ser limpa, forte, direta, objetiva. E é a Fonoaudiologia a ciência que está habilitada a pesquisar, avaliar, tratar e prevenir tais ruídos.
A presença de um profissional em uma emissora de rádio, habilitado em potencializar a conduta comunicativa de seus locutores, é indício de que esta se preocupa com a qualidade de seu produto final: a comunicação. Com essa premissa, a Radio Unifor, anteriormente denominada Rádio Gentileza , desde seus primeiros esboços, vem fazendo valer sua missão: utilizar-se da comunicação como uma forma de educar, agregando novos saberes e possibilidades
De uma experiência informal, realizada através de inserções de palestras proferidas na disciplina de Produção Publicitária em Rádio sobre a função da Fonoaudiologia na radiodifusão, foi desenvolvido o projeto de uma radio web, com o objetivo de desenvolver no universo radiofônico uma proposta de educomunicação.
No alicerce da rádio, consta o pilar da interdisciplinaridade, compreendida como um dos modos de se trabalhar o conhecimento, integrando aspectos que ficam iisolados uns dos outros. Fragmentar a comunicação não parece uma solução didática. A produção de uma peça radiofônica não se completa até o momento desta ser falada. E na fala está a Fonoaudiologia.
Sob o aval da interdisciplinaridade, foram estabelecidas metas para a operacionalização da rádio, onde a Fonoaudiologia propôs os seguintes objetivos:
- Colaborar no processo seletivo dos locutores
- Participar do processo de modelo de locução para a emissora,
- Aplicar avaliação e aperfeiçoamento permanente da comunicação oral dos locutores,
- Desenvolver a resistência vocal para evitar acometimento de distúrbios da comunicação oral e
- Realizar direção vocal durante a gravação dos programas e spots.
A inserção da disciplina Estágio Supervisionado II em Fonoaudiologia do curso de Fonoaudiologia da Universidade de Fortaleza - Unifor no projeto da rádio colabora para execução destes objetivos. Os alunos, em número de seis, participam das etapas de confecção da programação da rádio, exercitando ações interdisciplinares.
Em reuniões para a formatação da rádio, equipes foram responsáveis pela operacionalização de cada programa, da produção musical à locução. Porém, a idéia de realizar um banco de vozes surgiu da demanda de se utilizar vozes específicas para determinados spots e jingles. Semestralmente é realizada nos estúdios de rádio uma seleção de vozes das mais diversas qualidades: graves, agudas, fortes, frágeis, infantis, maduras etc. Candidatam-se alunos de todos os cursos da Universidade, assim como do corpo docente e administrativo. Depois de selecionados, são contatados posteriormente para participarem das locuções de acordo com as necessidades das peças publicitárias. Os candidatos que apresentarem alto e médio grau de desequilíbrio vocal serão desclassificados, porém encaminhados para o setor de Fonoaudiologia da universidade para realizarem reabilitação fonoaudiológica. Gerenciam este processo, os alunos do curso de Fonoaudiologia com colaboração do staff da rádio.
Behlau et all. (2005) relatam que alguns locutores apresentam uma marca vocal individual, sendo reconhecidos e contratados por este aspecto. Outros têm que desenvolver a marca vocal da emissora, para que o ouvinte localize-a no dial através de sua locução. Porém, acreditam que a locução deverá ser sempre embasada em determinados critérios como credibilidade, envolvimento e informalidade. Criar um modelo de locução para os programas não foi uma preocupação inicial da equipe. Desde os primórdios do projeto, discutiu-se a identidade sonora da rádio, mas um modelo de curva melódica, velocidade de fala e expressividade vocal não foi imposto aos alunos do projeto que realizariam a locução. Porém, alguns aspectos comunicativos foram considerados e desenvolvidos junto a Fonoaudiologia:
- Redução ou eliminação de rouquidão e ruídos respiratórios
- Atenção à articulação das palavras em Português e em outra língua
- Entonações pertinentes aos conteúdos dos programas
- Conservação dos traços de sonoridade regionais
Considerando que a rádio ainda encontra-se na fase experimental, a locução ainda está em fase de construção para posterior lapidação. Assim, o formato da locução se estrutura à medida que a rádio cresce em sua programação, suas metas e alcance.
A atenção fonoaudiológica está centrada no desempenho comunicativo dos locutores. Procedimentos são realizados para que estes se sintam confortáveis vocalmente frente aos roteiros e spots que desenvolvem. Palmeira (1996) refere que as etapas do programa de aperfeiçoamento da comunicação oral consistem de conhecimento da anatomofisiologia da voz, avaliação da conduta comunicativa, detecção dos distúrbios da fala e voz, aplicação de técnicas específicas de treinamento auditivo, adequação das posturas; relaxamento, aquecimento e desaquecimento do trato vocal; controle respiratório; articulação; ressonância; inflexão e interpretação. Atenção redobrada é fornecida ao uso do microfone, visto que é o principal instrumento de trabalho do locutor, amplificando as qualidades e os ruídos vocais. Normas de higiene vocal são introduzidas e discutidas, questionando os mitos e verdades sobre os efeitos positivos e negativos de algumas condutas para melhorar a qualidade da voz. Tais ações contribuem para a adaptação da comunicação às necessidades radiofônicas e para o aumento da resistência vocal reduzindo os risco de acometimento de distúrbios vocais decorrente do uso profissional da voz. O acompanhamento fonoaudiológico dos locutores também inclui encaminhamentos para exames laringoscópicos e audiométricos.
A direção vocal, compreendida como a regência vocal e interpretativa da locução, é realizada em estúdio antes e durante a gravação. São discutidas as melhores forma de distribuir a respiração no texto, apontadas as palavras de difícil articulação e desenhadas curvas melódicas para uma melhor interpretação dos textos. Retoma-se, aqui, o equívoco de tomar modelos de locução como referência. Farghaly (2002) alerta para que o locutor inexperiente não tenha como modelo um outro profissional, levando-o ao mau uso vocal, sobrecarregando o trato vocal e desenvolvendo quadros patológicos na voz. Ressalta que o locutor deve procurar seu próprio estilo em prol de uma expressividade mais natural e saudável. Os trabalhos com direção vocal auxiliam ao locutor a encontrar o modo de emissão adequado para determinada locução após experimentar vários outros. Com isto, se promove um maior número de possibilidades e ajustes vocais para a locução de um determinado texto, fazendo o locutor experimentar várias nuances de sua voz e amadurecer em direção ao seu estilo.
A participação de um profissional fonoaudiólogo na estrutura operacional de uma rádio colabora para a formação da identidade comunicativa da emissora. O processo interdisciplinar entre a comunicação social, no campo da radiodifusão, e a Fonoaudiologia, não acontece apenas visando uma complementação de conteúdos. Não são medidos os esforços para manter esta unidade comunicativa no ambiente da rádio, devido a este processo interdisciplinar ser um modelo que acumula ganhos e que auxilia na formação de uma mente plural de todos envolvidos na arte-ofício de se comunicar.
Os resultados iniciais deste trabalho apontam para a expansão do universo comunicativo onde a Publicidade e Propaganda acolhe a Fonoaudiologia como um saber agregado e transformador do seu fazer e esta amplia a sua visão de comunicação ao experienciar a construção de um veículo tão popular e tão presente em nossas vidas como a comunicação: o rádio.


Referências bibliográficas
BEHLAU, M. Voz – o livro do especilaista. Vol 2. Rio de Janeiro: Revinter, 2005
FERGHALY, S.M. Despertar de um novo encontro - a estética vocal e a comunicação radiofônica. In: FERREIRA, L. P.; ANDRADA E SILVA, M A. Saúde vocal: práticas fonoaudiológicas. São Paulo: Roca, 2002
PALMEIRA, C. T. Aperfeiçoamento vocal como instrumento de prevenção dos distúrbios vocais. Revista do Centro de Ciências da Saúde da Universidade de Fortaleza. 9: 26-29, 1996

Charleston Palmeira

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

O Homem, sua voz e seu destino

Dissertar sobre voz poderá findar em um texto de múltiplos enredos, tamanha a complexidade e grandiosidade do tema.
Discutimos muito sobre voz adaptada, voz profissional, voz patológica, ausência de voz... São assuntos que se reinventam, se transformam a cada novo debate, artigo, pesquisa ou livro. Ao tratarmos aqui sobre a voz do homem como gênero, ampliamos o estudo da voz também para o saber das Ciências Sociais. Saber este que não deve estar desagregado do saber fonoaudiológico devido a importância social da comunicação no mundo contemporâneo.
As demandas mercadológicas exigem cada vez mais uma comunicação saudável, livre de ruídos, sem interferências. Os profissionais buscam maximizar suas qualidades laborais, e é fato que a comunicação é parte integrante disto. Em uma sociedade latina, paternalista, a voz grave assume o papel do pai, da segurança, da fortaleza, da autoridade. Assim, não raro, nos deparamos com pacientes do gênero masculino que nos solicita redução de pitch e aumento da loudness para que possam se sentir mais seguros ou mais confiáveis e confortáveis. Isso sem entrar na discussão de crises de identidade que possam estar afetando estes homens.
Desde muito cedo é exigido do menino condutas comunicativas masculinas: “menino não chora, menino briga e tem que ganhar a briga!”. O período da muda vocal talvez seja o de maior instabilidade (fisiológica sabemos que sim) em relação a voz nos garotos. E essa instabilidade, advinda de questões sociais ou psíquicas, poderá custar um distúrbio da muda, uma quadro de puberfonia. Ao ingressar na idade adulta, percebemos que muitos homens escolhem sua profissão pela sua capacidade comunicativa. Muitos desistem de ser professores, advogados ou cantores por apresentarem uma qualidade de voz inadaptada, fraca, aguda, instável, abafada. É deste ponto que se abre uma reflexão sobre as relações sociais, profissionais e fisiológicas, ao inserirmos uma visão mais ampla do universo masculino às ações clínico-fonoaudiológicas. Ganha a Fonoaudiologia, ganham os homens.
Neste novo espaço para discussão, deixo este primeiro ponto de reflexão.

Charleston Palmeira.