quinta-feira, 24 de abril de 2008

Proposta de seqüência respiratória

O fonoaudiólogo constrói seu plano de trabalho baseando-se na anamnese, na avaliação propriamente dita, nos exames complementares e em aspectos subjetivos, tais como suas preferências e familiaridade com as técnicas. Ao estabelecer quais as técnicas deverão ser empregadas para um determinado quadro clínico, este as organiza em uma seqüência que Behlau et. al. (2005) definem como uma série de procedimentos ou exercícios organizados, com ordenação temporal predeterminada, para um fim específico. Assim, ao longo de sua prática, acaba por criar seqüências terapêuticas que muitas vezes merecem ser divulgadas e experienciadas por outros colegas.
Este artigo é resultado de alguns experimentos com uma seqüência que tem como base a organização da respiração para o aperfeiçoamento da comunicação oral e reabilitação fonoaudiológica para as disfonias.
Para a administração da referida seqüência é necessário que o paciente tenha realizado exercícios de relaxamento e alongamento da região cervical e face. Levando-se em conta a premissa de que a maioria dos pacientes s apresenta tensão fonatória, procedimentos de relaxamento propiciam melhores condições para o controle muscular, podendo, assim, desfazer padrões funcionais errados (de voz, postura etc.) e adquirir os corretos. Favorecem, também, a atenção e concentração para a execução das atividades propostas. Casos específicos como paralisias, paresias de laringe e distúrbios hipocinéticos devem ser analisados quanto à contribuição inicial de relaxamento laríngeo.
A seqüência respiratória é centrada na respiração inferior. Cabe ao fonoaudiólogo, juntamente com seu paciente, determinar o tipo mais apropriado: abdominal ou intercostal diafragmático. Ou seja, se a expansão abdominal é anterior, lateral ou em ambos. Aqui, a respiração abdominal anterior será a tônica, sendo instalada apenas solicitando ao paciente de dilate o abdome e ao contrai-lo produzir simultaneamente um sopro fraco e suave. O paciente não deverá entrar no ar de reserva. No instante que o abdome se dilata, a inspiração é realizada sem a participação excessiva da musculatura superior, fato este que contribui para a redução das tensões cervicais e laríngeas. Sugere-se, inicialmente, não utilizar os termos inspiração e expiração, pois de início, estão contaminados de tensão decorrentes da má utilização da respiração para fala. Após produção do sopro fraco, serão realizadas as seguintes seqüências de emissões:
- Sopro dividido em duas, três, quatro ou mais partes. Cuidado para não ocorrer uma inspiração entre eles. A quantidade de sopros está diretamente associada ao conforto e à capacidade respiratória do paciente.
- Emissão de fricativos surdos. O “s” geralmente é o de melhor rendimento, visto que o “f” poderá ser de difícil execução e o “x” exige maior gasto de ar. É importante que todos os fricativos sejam aplicados, de preferência alternados. Exemplos: inicia-se uma emisão com “s”, altera-se para o “f” e finaliza em “x” ou mesmo a realização de várias emissões em “s”, finalizando em “x”. A criatividade do fonoaudiólogo colaborará para a motivação do paciente frente aos exercícios.
- Emissão dos fricativos sonoros. A fonte glótica é acionada durante a execução dos exercícios sonoros com o “z”,”v” e “j”. O princípio é o mesmo dos fricativos surdos, alternando-os com os fricativos surdos. Exemplo: inicia-se com “s”, intercalando com o “z” em uma mesma expiração.
- Emissão das vogais. A atividade eminentemente glótica exercida pelas vogais, requer atenção do fonoaudiólogo para que não ocorram tensões, ruídos e incoordenações respiratórias. As vogais formam a realeza dos sons, por isso, todo cuidado é pouco. As vogais poderão ser emitidas após fricativos surdos e sonoros
- Emissão de números, palavras e frases. Neste momento, a atividade de fala é solicitada, aproximando o controle respiratório daquele utilizado durante a fala espontânea. O número de palavras deve ser aumentado gradativamente, atentando-se para os ajustes pneumofônicos.
- Leitura. Para o sucesso do exercício é necessária uma seleção criteriosa dos textos. Fontes grandes, frases simples e vocabulário coloquial favorecem a leitura, principalmente daqueles que têm dificuldades neste ato. Os textos de frases curtas devem anteceder os de frases médias e longas. Neste caso, a poesia é um recurso útil. Marcar com barras os pontos onde a inspiração deve ocorrer colabora para a fluência respiratória.
- Fala espontânea e fala profissional. A ultima etapa da seqüência respiratória envolve o uso da fala social e profissional. Comumente o paciente encontra dificuldades em coordenar a respiração com seus conteúdos de fala. Assim, a orientação para realizar frases curtas contribui para a efetividade do exercício.
Após todas estas etapas, acredita-se que uma respiração adaptada aos ajustes fonatórios esteja encaminhada. Cabe ao fonoaudiólogo, dentro de seus interesses, empregar a seqüência respiratória proposta com sensatez. Aliás, esta é a palavra chave quando o assunto é voz.
Charleston Palmeira

quarta-feira, 16 de abril de 2008

16 de abril - Dia Mundial da Voz

Quando abril se aproxima, nós, os fonoaudiólogos, já ficamos à espera de informações sobre as comemorações e ações a serem realizadas no Dia Mundial da Voz, 16 de abril. A semana que contempla este dia é recheada de eventos que se voltam para a promoção da saúde vocal, prevenção e detecção dos distúrbios da voz, em especial, aqueles que são reflexos do câncer de laringe. Sabemos que o dever nos aguarda, pois é hora de prestarmos nosso serviço à população carente de informação.
Com objetivo de conclamar a população para ações educativas voltadas para a conscientização vocal e suas implicações na comunicação, na saúde e na cultura, a campanha desenvolvida em torno do Dia da Voz promove uma grande visibilidade pelas autoridades e imprensa, mas principalmente uma significativa procura por parte da população.
Desde 1998, ano do início da campanha, a comunidade fonoaudiológica vem se mobilizando para promover ações que favoreçam a conscientização da sociedade quanto à importância da saúde vocal e a prevenção de alterações na voz. Em anos ímpares, a campanha visa atender a população, principalmente em praças públicas e em postos de atendimento. Nos anos pares a campanha é eminentemente educativa e institucional.
Estimular a presença de fonoaudiólogos e estudantes do curso de Fonoaudiologia nesta prática, colabora para o desenvolvimento de uma mente plural quando o assunto é a saúde coletiva. As experiências adquiridas em uma campanha desta natureza auxiliam ao fonoaudiólogo (e futuro) a compreender alguns aspectos deste trabalho junto à sociedade. Ganha a profissão e a população.
O sucesso da campanha é reflexo de uma parceria entre todos aqueles que acreditam que o fim último é o bem-estar da sociedade. E esta sociedade agradece ao espírito empreendedor e apaziguador do Dr. Wilson Meireles, coordenador geral da campanha, da Dra. Maria Carlos, que geriu a campanha de maneira exemplar; a todos os médicos e fonoaudiólogos que são os grandes amigos da voz; ao apoio do Conselho Regional de Fonoaudiologia 8ª. Região; à visão de saúde coletiva incorporada pelo Curso de Fonoaudiologia da UNIFOR, representado pela profa. Christina Praça e seus queridos docentes ao seu Centro Acadêmico e a todos os estudantes que abraçaram este exercício de cidadania e a Cooperativa de Fonoaudiologia do Estado do Ceará, que tem uma visão para além da empresarial: tem um compromisso com o social. Importante também salientar a participação do Conservatório de Música Alberto Nepomuceno que sempre abraça a causa de uma maneira singular através do canto.
Que nós possamos sempre trabalhar juntos em prol da saúde coletiva, que sejamos cada vez mais ousados em nossas atividades de promoção da saúde e que unamos ainda mais as nossas forças para a inserção da Fonoaudiologia no serviço público, já!
Charleston Palmeira

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Falsete mutacional - um estudo de caso

O falsete mutacional reflete o fracasso em adquirir uma voz de sonoridade adulta, não apresentando alterações de natureza estrutural laríngea. A apresentação de um caso clínico visa esclarecer sobre sua sintomatologia, diagnóstico diferencial, tratamento pertinente. Relataremos o caso de M., sexo masculino, 22 anos, balconista. Queixou-se de "voz muito fina e fraca", dificultando no seu convívio social. Referiu que no início da puberdade, começou a emitir "uma voz diferente", não a mantendo por considerá-la "uma voz grossa e feia". Os dados relevantes da avaliação perceptual foram: tensão fonatória associada à elevação da laringe, incoordenação pneumofônica caracterizada por utilização do ar de reserva, pitch muito agudo, loudness mediana, sonoridade intermitente com quebras para o registro basal, gama tonal e tempos máximos de fonação reduzidos. As provas terapêuticas, que envolveram uso da tosse, manipulação digital e bocejo, foram aplicadas com objetivo de realizar diagnóstico diferencial de alterações vocais de natureza hormonal, sensorial e estrutural congênita ou adquirida antes do período da muda vocal. O exame laringoscópico confirmou o diagnóstico de disfonia funcional, caracterizada por falsete mutacional. A reabilitação vocal teve como objetivo estabelecer a voz fisiológica, suscitando no paciente a percepção das mudanças ocorridas em sua voz, fazendo ater-se ao seu novo modo de se subjetivar através desta. Foram empregadas inicialmente as técnicas de tosse (que logo foi substituída por [R]) associada às vogais, sílabas e palavras; som basal; manipulação digital e vocalização inspiratória. Seguiram-se as técnicas de sons fricativos sonoros, vibrantes, nasais; exercícios de melodia e leitura para estabilização vocal. Utilizamos exercícios de relaxamento da região cervical, respiração, técnica de mastigação, bocejo e fala salmodiada, para promover suavização da emissão.Apesar da inicial rejeição da voz mais grave, o paciente assimilou positivamente sua nova forma de emissão, sempre referindo mudanças significativas em sua maneira de lidar com as pessoas e com a vida.

Charleston Palmeira