domingo, 4 de maio de 2008

Gesticulação e telejornalismo

O fonoaudiólogo quando atua junto ao telejornalismo tem como base um plano de trabalho que visa desenvolver a saúde vocal, a expressividade, a naturalidade do profissional, o ritmo de fala, a entonação e a suavidade do sotaque. A televisão, que tem a visão e a audição como principais canais de recepção, exige uma comunicação diferenciada do rádio, pois são solicitados, além dos recursos verbais e vocais, os recursos não verbais. Segundo Kyrillos, Andrade e Cotes (2002) são estes os recursos que colaboram para uma ideal expressividade dos profissionais do telejornalismo.
Os recursos verbais estão associados ao que é dito, ao conteúdo semântico e seu efeito sintático. É sempre oportuno lembrar que o fonoaudiólogo não desenvolve o texto, mas colabora na sua sonoridade, orientando sobre os efeitos negativos das frases longas, rimas e para o excesso de fonemas com a mesma sonoridade.
Os recursos vocais relacionam-se com os aspectos supra-segmentais, como pitch adequado para o texto, loudness variável, uso de pausas respiratórias e interpretativas, articulação precisa e sotaque, que não deverão se sobrepor à notícia. A inflexão, um dos aspectos mais importantes dentro do telejornalismo, deve variar de acordo com a intenção do discurso, através de alterações no pitch, na loudness e na velocidade da fala. Os gestos, as expressões faciais e a postura compõem o grupo dos recursos não-verbais. Gestos, recurso não-verbal mais utilizado, são ações corporais que transmitem uma idéia ou sentimento. Surgem de forma espontânea, para complementar ou conduzir a mensagem, sem que o outro perceba conscientemente (POLITO, 1996). Podem vir antes ou durante a fala. KNAPP e HALL (1999) destacam as seguintes funções para os gestos: substituir a fala, regular o fluxo e o ritmo da interação, manter a atenção, dar ênfase ao discurso e ajudar a caracterizar e memorizar o conteúdo do que é dito. Cotes (2002) relata que no telejornalismo a linguagem é única, onde a imagem e voz fundem-se e interatuam e a performance e a credibilidade são preocupações constantes. Os apresentadores devem passar uma imagem dinâmica, inspirando confiança, equilíbrio, segurança e honestidade. Menciona também que o telejornalismo é uma situação artificial e requer estudo prévio e que mais importante que as modificações dos gestos é a flexibilidade dos movimentos.
Ekman e Friesen (1981) classificam os gestos como:
Emblemas: tradução verbal direta (Ex: fazer figa, elevar o polegar). São evitados no telejornalismo;
Ilustradores: enfatizam a palavra ou frase (Ex: o garoto era desse tamanho);
Reguladores: são involuntários (Ex: movimentos de cabeça, direcionamento dos olhos);
Manifestações afetivas: configurações faciais que manifestam estados afetivos, conscientes ou inconscientes;
Adaptadores: manipulação de uma parte do corpo ou objeto, “muleta” (Ex: manipular o cabelo, mexer na caneta).
O trabalho junto à bancada no estúdio de telejornal requer atenção para a posição e o movimento das mãos, a expressão facial e a postura.
Cotes (2002) reforça que os filósofos da antiguidade designavam as mãos como segunda inteligência, tamanha sua expressividade e que revelam de modo involuntário as emoções. Seus movimentos no vídeo não devem ultrapassar a linha do queixo. Uma posição de descanso ou neutra deve ser adotada, evitando mãos separadas e espalmadas sobre a bancada. Gesticular com as duas mãos poderá parecer exagero no vídeo. Sobre a expressão facial deve-se evitar: fugir com os olhos, olhar para um ponto fixo, olhar desconfiado e olhar perdido (POLITO, 1996); expressar mistério, impenetrabilidade ou charme. As sobrancelhas acompanham os movimentos da cabeça e os aspectos supra-segmentares da fala em seus movimentos de elevação e abaixamento. Atentar-se para piscar os olhos, evitando o olhar perdido ou mesmo o excesso de piscadelas. A postura tem um caráter estético e funcional. Para o telejornalismo o ideal é uma postura ereta, olhando para a câmera, costas firmemente apoiadas, pés no assoalho e um pouco distantes. Assim, transmite-se segurança (COTES, 2002).

Alguns exercícios poderão ser realizados, como sugerir um modo de gesticular de acordo com as seguintes frases:
- O importante na obra de arte é o espanto (Charles Baudelaire). Gesto: um dos indicadores poderá estar para cima finalizando com sobrancelhas levemente elevadas.
- Ópera é quando o sujeito recebe uma facada nas costas e, em vez de sangrar, canta (Ed Gardner). Gesto: início com mãos em posição neutra, depois seguem unidas para direita e ao final para a esquerda.
- Eu não procuro. Eu encontro (Pablo Picasso). Gesto: as mãos poderão apontar para fora e ao final para dentro.
- É revoltante ver uma pessoa que se sacode e diz que é ator ou atriz. (Raul Cortez). Gesto: evitar o gesto ilustrado de rebolar. As mãos poderão fazer um gesto de negação e a cabeça pontuar as palavras ator e atriz.
- Este maestro rege como se estivesse batendo maionese (Hebert Von Karajan). Gesto: o dedo indicador de uma das mãos poderá realizar um círculo suave indicando o movimento da maionese

O trabalho deve obedecer a filosofia da empresa que veicula o telejornal. Porém, regas básicas são úteis para evitar excesso ou ausência de expressividade. Assim, o bom senso também é um aliado para não tornar notícias sérias em sensacionalistas e as vitórias esportivas, em derrotas.

Charleston Palmeira

Referências
COTES, C. Articulando voz e gesto no telejornalismo. In. FERREIRA, L. P.; ANDRADA E SILVA, M A. Saúde vocal: práticas fonoaudiológicas. São Paulo: Roca, 2002.

KYRILLOS, L.; ANDRADE, D.F; COTES, C. Fonoaudiologia na telejornalismo. In. FERREIRA, L. P.; ANDRADA E SILVA, M A. Saúde vocal: práticas fonoaudiológicas. São Paulo: Roca, 2002.

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