terça-feira, 20 de maio de 2008

O Abandono terapêutico

“Quando não estou nem disposto, nem senhor de mim,
cada um de meus doentes se torna para mim um espírito maléfico”
(Carta 130 de Freud à Fliess)

Anos de estudos acadêmicos em anatomofisiologia, patogenia, avaliação e reabilitação dos distúrbios vocais, por vezes nos afastam da compreensão de determinados movimentos da clínica fonoaudiológica. O abandono terapêutico é um destes. É a nossa experiência clínica que nos permite questionar quais os motivos que levam o paciente a abandonar seu tratamento. A formação positivista nos priva de adentrarmos mais intimamente nas imagens do paciente frente a sua voz, no conhecimento das possibilidades deste em modificar suas características comunicativas, calcadas na cultura, e na forma de estimular a motivação para estabelecer mudanças necessárias na sua conduta vocal desviada. Em muitos pacientes prevalece uma extraordinária resistência à reabilitação vocal devido ao desejo ou necessidade de perpetuar uma voz que lhe traga ganhos secundários (econômicos, sociais, pessoais etc.) e a dificuldade de eliminar hábitos prazerozos(listados nos quadros de abuso e mau uso vocal). Como, então, compreender melhor estes fenômenos quando possuímos uma leitura eminentemente organicista-positivista das manifestações disfônicas?
Entendemos que seja função do fonoaudiólogo investigar, não só o histórico da disfonia, as características comunicativas e as alterações funcionais e estruturais do aparato fonador, mas também os aspectos que fazem o paciente resistir à reabilitação findando no abandono de seu tratamento. É compreender que este universo comunicativo, onde a voz é apenas uma parte integrante da grande linguagem, está ligado ao imaginário, ao desejo, à repressão, à corporalidade(KÖRNER, 1981) , reflexo das relações com a cultura
Compreender as técnicas terapêuticas como suporte ou mesmo trampolim para atingirmos uma voz viável social e profissionalmente, exclui a possibilidade de utiliza-las unicamente com fins motores. Entendemos que os distúrbios da voz perpassam por uma disfunção cinética, devendo ser tratada como tal, porém uma visão reducionista da ação terapêutica pormenoriza questões subjetivas, emocionais e psicossociais em detrimento das questões eminentemente fisiológicas. Esta postura leva-nos a crer que o fonoaudiólogo, inúmeras vezes, protege-se por detrás do discurso organicista, quando deveria manter-se além do discurso corrente do paciente-sujeito.
É sempre necessário refletir nosso papel frente a reestruturação das representações ligadas à voz e a disfonia e ao movimento da subjetividade do paciente disfônico em terapia. É compreender a comunicação como um processo mais complexo e instigante . Acreditamos ser esse o ponto-chave para o início do entendimento da relação homem-mundo-sintoma na clínica fonoaudiológica, trazendo o paciente-sujeito mais próximo, fazendo com que o paciente sinta-se apoiado e compreendido na sua real problemática , na tentativa de compreendermos, cada vez mais, as nossas “brechas terapêuticas”.
Charleston Palmeira

Um comentário:

Anônimo disse...

Oi Dr. Charleston,

Sou aluno de rádiojornalismo da Kátia Azevedo, na Fa7. Seu nome foi indicado por ela para que eu e você possamos "tratar" a minha voz. Você atende pelo plano Unimed?

Você pode responder através de um comentário no meu blog ou, se preferir, mandar um email para marcosrochaxp@hotmail.com

Aguardo a resposta.

Abraço!